O Joãozinho é muito prático e pragmático. A Leninha não percebe de matemática, mas tem mão para a música. O André é o mais criativo da turma, embora dê uns erros no Português. A Andreia tem um jeitão para o raciocínio matemático. O Nelson nasceu equilibrista, um mestre dos movimentos coordenados e precisos. A Carla resolve conflitos e negociações como ninguém, mantendo a calma e sorrindo sempre. O Marco tem o dom da palavra e da escrita. A Maria tem uma capacidade de síntese e análise brilhantes.
Há 32 anos, pelo menos, que se sabe que a inteligência não existe – existem sim, vários tipos de inteligência. Até ao momento, parece que são 9. Sim, 9.
Os trabalhos do psicólogo Howard Gardner abriram caminho para uma compreensão mais ampla da inteligência. Há 9 tipos de inteligência: a naturalista, a musical, a lógico-matemática, a existencial, a interpessoal, a intrapessoal, a corporal-cinestésica, a linguística e a inteligência espacial. Desconfio que hajam muitas outras, o que diz bem da diversidade humana. E a cada dia surgem mais “inteligências”, sucedâneas destas 9, e que ajudam a vender livros. Caso queira saber em 1 minuto quais as 9 inteligências, em português, consulte: http://www.updateordie.com/2015/01/31/os-9-tipos-de-inteligencia-humana/
A par da dimensão “Inteligência”, existe a própria dimensão “Aprendizagem” em si, e essa tem séculos de história: há quem aprenda fazendo, há quem aprenda observando, há quem aprenda pelo hábito, há quem aprenda sendo condicionado (condicionamento clássico), quem aprenda por interacção com o ambiente (em busca de recompensas, condicionamento operante), por tentativa e erro, pela experiência de vida, por uma visão global das coisas (“o todo é mais do que a soma das partes” – Gestalt), entre outras. Mais se poderia dizer, mas isto já chega.
Há um paradoxo actual que me incomoda: se existem tantas abordagens reconhecidas, quer da aprendizagem, quer da inteligência, quer da pedagogia, quer do ensino em si, porque é que a escola continua a limitar as nossas crianças e adultos, como se só existissem 2 ou 3 abordagens?
Porque é que só agora os responsáveis pela educação começam a ver que “fazer exames”, não traz verdadeiramente um proveito significativo aos alunos? Porque é que havendo tantos tipos de inteligência, a maioria das escolas continua a avaliar a sua existência com métodos que apenas parecem aceder à logico-matemática e à inteligência linguística? E porque é que estão a sujeitar os mais pequeninos a esta visão limitada da aprendizagem, com coisas como “exames”?
Na mesma linha, parece haver uma loucura instalada na Educação em Portugal, que tenta preencher a agenda dos alunos com demasiados trabalhos – muitos deles também baseados em 2 ou 3 abordagens (apenas). Nem alguns gestores de topo têm uma agenda tão preenchida como um estudante do 10º ano! Esta dinâmica gera uma alienação do estudante com o mundo “cá de fora” que, por curiosidade, é aquele em que vai viver o resto da sua vida.
A sobrecarga de trabalho escolar, aliada a uma avaliação de aprendizagem limitada tem, para mim, consequências que já se notam no dia-a-dia. Pessoas desadaptadas à sociedade quando saem do ensino, desadaptadas à realidade das empresas, desadaptadas em termos de relações com os outros e com o mundo. Adultos cujos dons (ou inteligências) foram esmagados por uma aposta exclusiva das escolas em outros dons (que não os seus). Talentos que não viram a luz do dia, porque não tiveram oportunidade de serem avaliados pelos testes de papel & caneta. Mortos vivos que frequentam as escolas (por obrigação), mas não vivem as escolas. Há todo um mundo de talentos enclausurados nas escolas portuguesas, porque não se conseguem manifestar, nem ser avaliados pelo sistema – para receberem o devido aplauso.
Seria bom que as escolas começassem a implementar outras formas de avaliação, e outros trabalhos para entreter os alunos. Para mim, dar MENOS trabalhos aos alunos até seria uma solução proveitosa. Deixo aqui algumas ideias para trabalhos, por mais que sejam uns grãos de areia no deserto.
– Fazer um vídeo timelapse de uma flor a desabrochar ou o amanhecer numa cidade
– Ir para junto do mar, uma vez por dia, em diferentes horas ao longo de uma semana, e escrever um diário da experiência que tiveram.
– Experienciar uma aula de meditação
– Comporem uma música num instrumento à escolha
– Criarem uma pequena horta num jardim e fazerem um relatório sobre isso
– Aprender um desporto novo, ou inventar um
– Realizar uma boa acção por dia (documentada), durante uma semana e expressar o que sentiram ou aprenderam.
– Ajudar um amigo a ultrapassar um problema
– Documentar o dia-a-dia de um animal doméstico
– Ceder uma hora por dia, durante uma semana, para conversar com uma pessoa idosa que viva sozinha. E escrever sobre o que sentiram, ambos, nesse processo.
Francisco Teixeira
www.franciscoteixeira.com
Consultoria e formação em Comportamento do Consumidor
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