Confesso que não entro em delírio com a Nutella, embora goste. Devo ser uma das 4 pessoas entre 7 biliões de habitantes do planeta que pensa assim. Esperem, esqueci-me de uma quinta pessoa, parece que vive num mosteiro no Tibete.
Mas o marketing da Nutella, isso já é outra história. A esse nível, a marca deve estar a par de uma Coca-Cola ou assim.
Não se iludam: a Nutella tem uma estratégia consciente para dominar o planeta. Está a tornar-se em mais do que uma marca – está a tornar-se num movimento.
Acabou-se o croissant com chocolate, a Tripa de Aveiro com chocolate, a Bolacha Americana com chocolate. O que interessa agora é se o chocolate é Nutella. Mais simples: interessa saber se tem Nutella, mesmo que não tenha chocolate.
Para os desatentos, existe um Dia Mundial da Nutella, que é no dia 5 de Fevereiro. Na Austrália, existe mesmo um evento inteiramente dedicado à Nutella, denominado de Nutella-Palooza.

A geoestratégia mundial corre também sérios riscos de ser afetada pelo delírio Nutella: a McDonald’s Itália tem um menu de pequeno-almoço em que o hambúrguer… é de creme Nutella. Os “riscos” advêm do facto de este menu apenas estar disponível em Itália – é uma questão de tempo até outros países começarem a reivindicar o dito. Vai ser o caos. Mas a origem das coisas deve ser premiada e, verdade seja dita, o Grupo Ferrero (detentor da marca) teve origem em Itália.

Mas o fenómeno ainda vai crescer, pois a Nutella está à procura de nomear um embaixador-chefe para a marca. O(a) fã que for escolhido(a) está condenado a tornar-se numa celebridade instantânea. Ah! E existe uma Nutella Nation em cada esquina da Internet.
Menos conhecida é a cerveja inspirada na Nutella – a Nuts and Malts (da Big Shed Brewing) – mas que ela existe, existe!
Em Portugal, o franchising da Nutella vai de vento em poupa, através das lojas Nut. Há filas à porta destes paraísos, onde se podem consumir vários produtos com o creme de avelãs mais famoso do mundo. Há quase um ritual de fondue de chocolate… mas com Nutella. A Nutella vende-se nos supermercados como pãezinhos quentes (e come-se com pãezinhos quentes também).
É interessante que hoje em dia se fale de Nutella como “chocolate”, substituindo o verdadeiro chocolate em milhares de receitas por esse mundo fora. Quero um waffle com chocolate Nutella! Mas o mais correcto seria chamar-lhe creme de avelãs com um toque de cacau (segundo reza a Wikipedia, o cacau não era abundante na altura em que a Nutella nasceu, pois estava racionado após a II Guerra Mundial). Já as avelãs, eram famosas na zona de Alba, onde se produziram os primeiros cremes para barrar.
Voltando ao Marketing, a jogada de mestre tem sido a equiparação do creme Nutella com o chocolate. Como se consegue deixar fora de jogo uma coisa tão nobre como o chocolate? Como conseguirá a indústria chocolateira “genuína” reagir a um creme para barrar, que lhe vem surripiar o mercado? O que podem fazer as Godivas, as Nestlé’s, as Lindt’s deste mundo para inverter a situação? A Nutellização do mundo chegou para ficar.

Obviamente, há que perceber que para um creme de barrar se impor desta forma, é necessário ser-lhe reconhecida qualidade. Tem de lhe ser reconhecido o respeito pela história (a Nutella já percorreu um longo caminho desde 1964). E há também todo um Branding inteligente por parte do Grupo Ferrero. Eu gosto de Tulicreme, mas falta-lhe toda a entourage que a Nutella tem para poder augurar a tal sucesso.
Mesmo a ideia de que o produto é para um pequeno almoço enérgico e saudável, maioritariamente associado a crianças, está a esfumar-se. O seu consumo está a tornar-se mais global (diferentes momentos do dia) e até mais adulto (veja-se o público das lojas Nut).
A Nutella deixou de ser um acessório (o creme para barrar o pão) e passou a ser central (o creme em que tudo e todos querem docemente chafurdar).
E passou a ter um preçário especial (mais caro) quando um produto é servido com chocolate Nutella.
Para quem não aprecia o sabor, esta subida ao estrelato pode não ser uma boa notícia. Se eu quiser uma água com gás, o standard é Pedras – lá tem uma pessoa que dizer que quer Castelo. O mesmo pode estar a passar-se com o mundo dos chocolates. A variedade própria do chocolate, pode tornar-se na monotonia Nutella. É como entrar num centro comercial que é igual ao centro comercial anterior. A estandardização faz com que as montras dos shoppings nos pareçam todas iguais.

Calculo que neste momento, já esteja a ser projetado um chocolate Nutella (sólido, e não um creme para barrar). Ou mesmo um leite achocolatado Nutella. Estamos a ser invadidos… mas é uma invasão docinha.
Se gostou deste texto, saiba que o seu autor procura integração numa empresa que dê valor à Experiência do Consumidor, à inovação com significado e que não tenha medo de ser customer-centric. Recorrendo a uma buzzword, é um Marketing Psychologist disponível para suar a camisola. E sabe fazer outras coisas interessantes, para além de falar de doçuras: tornar as empresas únicas e especiais é uma delas. Falamos?
Psicologia do Consumo | Estudos de mercado | Inovação | Branding Strategy Customer Experience Management
Pelo Planeta, por nós, devemos agir contra um produto que usa, abusa de deliciosa inocência. Nutella é feito com óleo de palma. Não é necessário acrescer mais informação. Ou será?
Maria,
Não sei bem se a questão é o óleo de palma (utilizado por milhares de produtos em todo o mundo), mas sim o que se faz ao meio ambiente para a sua produção. E nesse contexto, há um problema crónico dos governos e populações, que urge resolver.